Prefeitura de Salvador quer implantar botão do pânico (A Tarde – 11/11/2013)

O botão é leve e preso ao corpo por um cinto. É parecido com um controle remoto de garagem (Foto: Antônio Cosme/ Divulgação)
Mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que estão sob medida protetiva concedida pela Justiça para se resguardar dos agressores deverão ter um novo aliado. De acordo com a vice-prefeita Célia Sacramento, o município implantará o dispositivo de segurança conhecido como “botão do pânico” até o início de 2014.
Ao ser acionado, o equipamento avisa à polícia que a mulher está em risco.
De janeiro a outubro deste ano, 973 mulheres solicitaram medidas protetivas para resguardar suas vidas na capital baiana, segundo dados da 1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher em Salvador.
A situação se agrava ainda mais no contexto estadual. A Bahia é o segundo estado com o maior número de casos de morte de mulheres decorrente de violência doméstica.
Entre 2009 e 2011, o Estado registrou uma taxa de feminicídios (mortes de mulheres por conflito de gênero) de 9,08 casos por 100 mil mulheres, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A Bahia ficou atrás apenas do Espírito Santo (11,24), no qual a prefeitura de Salvador se espelha para implantar o botão.
Apesar de reconhecer a urgência para a implantação e de afirmar que havia intenção de adotar a estratégia desde o início do ano, a iniciativa depende ainda de sanção do prefeito ACM Neto.
Célia antecipou que Neto deve sancionar o Projeto de Indicação do vereador Paulo Câmara que sugere ao Executivo a responsbilidade de implantação do dispositivo.
“É um pedido do movimento de mulheres. O prefeito já tem o projeto em mãos. Ele vai sancionar”, destacou a vice-prefeita.
Concedida a vítimas de violência que estão em risco contínuo, a medida protetiva, na maioria dos casos, determina que o agressor fique proibido de se aproximar e se comunicar, seja por mensagens eletrônicas, telefonemas ou até recados dados por amigos.
Aparelho
A iniciativa foi adotada pela primeira vez no País pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES), este ano, em parceria com a prefeitura de Vitória. O equipamento se assemelha a um controle remoto e está vinculado a uma central de monitoramento. Ao ser acionado, alerta uma patrulha da Guarda Municipal capixaba, que vai ao local para tentar impedir o desfecho de violência.
O botão ainda funciona como um gravador e capta o áudio no local, o que poderá ser utilizado como prova.
Para a prefeitura de Salvador, a adoção esbarra na falta de estrutura da Guarda Municipal soteropolitana. A saída, segundo a vice-prefeita, é o apoio da Polícia Militar.
“A PM é eficiente. Não vai ser difícil o diálogo com o governador e o comandante da PM, Alfredo Castro. A Guarda Municipal não tem essa estrutura”, acrescentou Célia.
A assessoria da PM informou que ainda “não foi instalada sobre o tema”.
Proteção
Gerente do Centro de Referência Loreta Valadares – que oferece atendimento para mulheres vítimas de violência -, Celina de Almeida considera a futura implantação positiva, diante dos muitos casos em que agressores não respeitam medidas protetivas.
“E tem também a dificuldade de execução das medidas. Às vezes, nem o oficial consegue entregar ao agressor o documento para que ele não se aproxime da vítima”, ressaltou Celina.
A prefeitura precisa ainda de apoio do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), porque seria a instância que avaliaria quais mulheres devem ser monitoradas. A frente da Coordenadoria da Mulher do TJ-BA, a desembargadora Nágila Brito disse que o órgão está “aberto ao diálogo”.
“Nós (desembargadores) já temos uma espécie de botão do pânico nas nossas salas por causa da nos- de risco. Para implantar vai precisar de convênio. O Judiciário é um poder inerte. Tem que ser acionado”, ressaltou a desembargadora.
Projetos requisitam implantação do aparelho
Dois projetos, um de indicação e outro de lei, destacam a necessidade de implantação do botão do pânico em Salvador.
No âmbito estadual, há o Projeto de Lei 20.285/2013, da deputada Graça Pimenta. O texto propõe que seja criado o Programa de Proteção à Mulher, que obriga o Estado a disponibilizar o equipamento para mulheres vítimas de violência nos municípios baianos que têm Delegacia Especial de Atenção à Mulher (Deam). A Central de Monitoramento, ressalta o texto, deve ser implantada na própria Deam, que disponibilizará, ainda, as patrulhas.
Município
Na Câmara Municipal de Salvador, tramita um projeto de indicação (que não tem força de lei) de autoria do vereador Paulo Câmara.
O objetivo, segundo o projeto, é sugerir que o Executivo adote o equipamento com o apoio da Secretaria Municipal de Ordem Pública, por meio da Guarda Municipal.
Para a titular da 1â Vara de violência doméstica e Familiar contra a Mulher, a juíza Márcia Lisboa, é necessário que se torne lei. Em Vitória, há um convênio entre o Tribunal de Justiça e a prefeitura. “Tem que deixar de ser projeto de governo para ser de estado”, destacou a juíza.
“Já era para estar instalado”
Criada para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha não prevê monitoramento das vítimas. Se houver descumprimento, cabe às próprias mulheres relatarem o ocorrido.
O botão serviria para fiscalizar esses casos. “Já era para estar instalado, mas tem que pensar na estrutura. Não basta só implantar. Vai haver policiais rápidos para atender as mulheres? Vai aumentar o número de oficiais para entregar as medidas?”, questiona uma pesquisadora de 28 anos, que está sob medida protetiva, mas não quis ser identificada.
“Não existe fiscalização. Até hoje sofro com agressões verbais”, acrescentou a pesquisadora que saiu de casa para fugir do marido.
Coordenadora estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES), a juíza Hermínia Azoury participou na última sexta-feira de uma audiência pública sobre o tema na Assembleia Legislativa da Bahia. Ela disse que a iniciativa de implantação do dispositivo deve partir do Tribunal de Justiça.
“Nada impede que a prefeitura faça a parceria, mas é o Judiciário que vai fazer a triagem”, afirmou.
Azoury contou ainda que, em Vitória, os dispositivos foram doados pelo Instituto Nacional de Tecnologia Protetiva (INTP). Ao saber do patrocínio do instituto, a desembargadora do TJ-BA Nágila Brito disse que vai procurar o INTP
Estado ainda tem déficit de delegacias especializadas
O Estado precisa de mais 29 Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam). A informação é da secretária estadual de políticas para mulheres (SPM), Lúcia Barbosa.
“Mas o governo do estado não tem como fazer isso de imediato”, afirmou a secretária. Atualmente, na Bahia, há 15 unidades especializadas.
Ainda de acordo com a secretária, em encontro realizado na semana passada, o governador Jaques Wagner determinou ao secretário da Segurança Pública, Maurício Barbosa, que tentasse ampliar o número de Deams, “mesmo com o contingenciamento”.
“Estamos estudando quantas poderão ser instaladas. Elencamos como prioridade nove, mas pode ser que a gente não chegue a este número”, acrescentou a titular da SPM.
No encontro com o governador, que teve ainda a participação da bancada feminina da Assembleia Legislativa da Bahia, o botão do pânico não foi abordado.
“É um assunto delicado. Tem várias experiências de dispositivos em curso. Umpo- der só não implementa. O TJ-BA é o essencial”, disse a secretária, referindo-se à experiência de Minas Gerais que adotou tornozeleiras para monitorar os agressores.
Anderson Sotero
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